The Crush House: Câmera na Mão, Segredo na Tela

Boninho, aposente-se já! Me dê a vaga para produzir o Big Brother Brasil, pois passei horas jogando “The Crush House” e recebi meu diploma de diretor de um reality show que se passa em 1999 em uma mansão no alto de um prédio. 

Aqui estamos diante novamente de mais um daqueles jogos que, à primeira vista, pode parecer uma simples e divertida sátira aos reality shows, mas que, ao ser explorado com maior profundidade, revela-se uma obra complexa e cheia de nuances. 

Desenvolvido pelo estúdio britânico Nerial, conhecido por títulos como “Reigns” e “Card Shark”, e publicado pela Devolver Digital, o jogo transcende o mero entretenimento, proporcionando uma reflexão inesperada sobre a cultura dos reality shows e o papel do espectador nesse universo de voyeurismo e manipulação.

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Uma Introdução que Engana

No início, “The Crush House” se apresenta como uma simulação cômica e um tanto absurda de um reality show ambientado em 1999, na luxuosa e decadente mansão de Malibu. Você assume o papel de Jae Jimenez Jung, a nova produtora de um dos programas de maior audiência da época, e sua missão é simples: selecionar os participantes, filmar os momentos mais picantes e atender às exigências de uma audiência faminta por drama. Mas rapidamente, o jogo começa a mostrar suas verdadeiras intenções, e o que parecia ser uma jornada leve e descompromissada se transforma em uma complexa narrativa cheia de mistérios e dilemas éticos.

O Cenário e os Participantes

A ambientação em “The Crush House” é um espetáculo à parte. A mansão, situada em um penhasco à beira-mar, serve como um personagem adicional na narrativa, com seus corredores luxuosos e seus cantos escuros que escondem segredos. A estética visual do jogo, com suas cores vibrantes e design nostálgico dos anos 90, contribui para criar uma atmosfera imersiva que imediatamente transporta o jogador para aquela época.

Os participantes do reality show são uma mistura fascinante de arquétipos de personagens que esperamos ver nesse tipo de programa: desde o bon vivant francês Emile, famoso entre as mães de família, até a “rainha do drama” Joyumi, uma mulher obcecada por controle. Cada personagem traz suas próprias histórias e traumas, que se desenrolam ao longo do jogo, revelando facetas inesperadas de suas personalidades. É impossível não se envolver com as interações entre eles, que variam de brigas acaloradas a romances inesperados, passando por momentos de introspecção e crise existencial.

Mais que um Espectador

A jogabilidade de “The Crush House” coloca o jogador em uma posição de poder e responsabilidade que vai além do simples ato de assistir. Como produtor, você precisa tomar decisões críticas sobre o que filmar, quando interromper a transmissão para exibir comerciais e como manipular as situações para agradar a uma audiência exigente e diversificada. Cada tipo de público – dos fetichistas de pés aos amantes de conspirações – exige um tratamento específico, e equilibrar essas demandas é um desafio constante.

A jogabilidade em primeira pessoa não tem muito mistério. Uma câmera na mão e um botão para filmar. Você só precisa disso para jogar The Crush House. As mecânicas são simples, mas apenas após alguns dias conhecendo a casa e os participantes, você irá lidar com a variedade de público de forma mais objetiva e estruturada. 

Por exemplo, o público representado pelo ‘Voyeurismo’ pede para que filme os participantes como se eles estivessem sendo gravados por uma câmera de segurança, então subir no teto da varanda da piscina e espiar os participantes se bronzeando, irá aumentar a afinidade com esse público. O público dos adolescentes tarados, bom…. acho que não preciso nem dizer o que eles querem de fato ver. 

A estrutura do jogo é construída em torno de um ciclo semanal, onde cada “temporada” do reality show dura cinco dias. Durante esse período, o jogador deve garantir que as necessidades da audiência sejam atendidas, caso contrário, o programa pode ser cancelado. Este sistema cria uma tensão crescente à medida que avançamos no jogo, especialmente quando novas camadas de mistério começam a emergir. A cada noite, após o fim das gravações do dia, os personagens podem abordar Jae com pedidos peculiares, desde a compra de um karaokê até a realização de tarefas misteriosas que revelam mais sobre o verdadeiro propósito da mansão.

Agradando ao público, você consegue mais patrocinadores, e precisa lidar bem com o tempo para veicular os intervalos comerciais. Quanto maior a audiência, mais dinheiro você ganha com os comerciais, mas o frio na barriga de rodar um comercial e perder alguma coisa chocante que os participantes do reality possam vir a fazer, pode ser um trabalho que vai te colocar em dilemas que melhoram a experiência de risco do jogo. 

Com o dinheiro recebido pelos patrocinadores, é possível comprar novos itens para a casa, que variam desde estátuas de decoração à churrasqueira. Todos os itens comprados na casa, desbloqueiam novas possibilidades de conteúdo para serem filmados durante o dia. 

Mais do que Apenas Salseiro

O que diferencia “The Crush House” de outras simulações de reality show é sua narrativa intrincada e surpreendente. O jogo não se contenta em ser apenas uma paródia do gênero; ele explora temas profundos como a natureza do voyeurismo, a desumanização dos participantes e as implicações éticas de manipular vidas humanas em nome do entretenimento.

Conforme a história avança, Jae descobre que a mansão esconde segredos sombrios. O jogo insinua que os participantes atuais são cópias de concorrentes originais, criados por uma máquina sinistra que mantém o show no ar há anos. Este elemento de ficção científica, embora bizarro, é tratado com seriedade suficiente para fazer o jogador refletir sobre as consequências morais de tal tecnologia. A tensão entre seguir as regras da produção ou ajudar os personagens a escapar de seu destino se torna o centro emocional do jogo, culminando em múltiplos finais que dependem das escolhas do jogador.

Esse ar de mistério é adicionado de forma sutil e em pequenas doses, mantendo um bom fluxo de gameplay entre o seu papel principal, e o agora, secundário. Além de produtora de um reality show de qualidade duvidosa, você precisa investigar o que acontece naquele prédio e… o que tem naquele suco.

Desafios e Recompensas

Embora “The Crush House” seja visualmente deslumbrante e narrativamente rico, ele não está isento de falhas. A repetitividade de algumas tarefas, como filmar constantemente as mesmas cenas para agradar a diferentes públicos, pode se tornar cansativa, especialmente nas fases avançadas do jogo. Além disso, a curva de dificuldade pode ser frustrante para jogadores menos pacientes, com algumas missões exigindo um nível de precisão e timing que beira o exasperante.

Eu poderia dizer que as primeiras 4 horas de The Crush House é extremamente viciante, o loop de gameplay vai te proporcionar novas possibilidades que vão te deixando sempre com a pulga atrás da orelha. De “só mais um dia” para “só mais uma temporada”, e quando você se dá conta, já se foram algumas horas acompanhando a casa mais vigiada de 1999. Infelizmente o jogo esbarra em uma parede invisível de ritmo após algum tempo, e talvez não tenham escolhido a melhor hora pra acabar. 

O jogo também apresenta alguns problemas técnicos, como quedas de performance e bugs ocasionais, que podem atrapalhar a imersão. No entanto, o estúdio já se comprometeu a lançar atualizações para corrigir esses problemas, o que deve melhorar a experiência geral.

Um Reality Show como Nenhum Outro

“The Crush House” é uma experiência única no mundo dos jogos. Ele desafia as expectativas ao combinar a leveza e o entretenimento de um reality show com uma narrativa que provoca reflexão e um gameplay que exige envolvimento ativo do jogador. A mistura de humor, crítica social e suspense cria um jogo que é ao mesmo tempo divertido e perturbador.

Se você está procurando um jogo que vá além da superfície e ofereça uma experiência rica e multifacetada, “The Crush House” é uma excelente escolha. Ele não só proporciona horas de entretenimento como também deixa o jogador pensando sobre o que realmente significa consumir e participar de conteúdo de mídia. É uma obra que, apesar de suas falhas, merece ser jogada e discutida.

The Crush House está disponível para PC na Steam.

The Crush House

NOTA - 7.7

7.7

BOM!

The Crush House surpreende ao misturar a leveza dos reality shows com uma narrativa cheia de mistérios. Com um visual nostálgico dos anos 90, personagens carismáticos e um gameplay interessante, o jogo é uma experiência única que provoca risos e reflexões. Apesar de alguns momentos repetitivos e pequenos bugs, vale a pena se aventurar nessa mansão cheia de segredos. Se você curte um bom drama com um toque de ficção científica, este é o jogo para você!