Em recente artigo da IGN foi dito que a bolha dos grandes jogos estourou e que o caminho agora poderia ser trilhado pelos jogos com escopos realistas a fim de manter a mídia saudável. Imediatamente o Bokeh Studio respondeu a este mesmo artigo pedindo: “Que tal começar aumentando um pouco a nota para nosso jogo Slitterhead?”. O tapa na cara expõe o fato de muitas vezes você não acreditar no que você mesmo diz. Embora eu tenha tido vontade de muitas vezes largar Slitterhead, o meu sentimento é de que para muitos redatores é mais fácil e prático fazer piada dos jogos do que tentar entendê-los. Isso, ao mesmo tempo que se para de colocar as mesmas expectativas erradas de novo e de novo em cima do produto errado. Nesse mundo no qual a Sony acostuma mal as pessoas com um fast food gourmetizado em formato de jogo, é preciso começar a consumir pratos diferenciais e zerar as expectativas em mesa.
Slitterhead nasce da independência do time original de Silent Hill, e dessa vez sem o mesmo orçamento para fazer qualquer coisa num escopo maior. Foi dito pelo próprio diretor que o título visa angariar fundos para projetos maiores e mais acertados. O que resta a ser analisado, fora os seus erros, são as suas ideias livres de compromisso com investidores e gravatas borboletas, mirando no que se deseja fazer no quê se pode.
Pareço estar indo na direção do protecionismo, mas a história não tem final feliz. Mas vamos com calma. Slitterhead em sua base é um jogo de hack’n’slash com twists interessantes, só que no meio de seu caminho há uma pedra enorme. Várias delas eu diria.
Em tese, você está em ruas chinesas, em noites calorentas e agitadas, em becos apertados e pessoas que não parecem ter grande perspectiva de vida. Boa parte desta descrição é sugestiva, pois onde se pode economizar em cutscenes e orçamento, será economizado.
Uma entidade flutuante necessita possuir qualquer corpo vivo para continuar a sua existência. Ela está ciente mais e mais do que está acontecendo. Isso dá luz à mecânica principal do jogo, a qual é totalmente emprestada do game Driver San Francisco. Você escolhe qualquer ser humano e controla-o, como um novo zumbi. Tão cedo você aprende que tem alguma espécie de parasita, que faz algo similar e está rondando o bairro, só que a pegada desses soa muito mais como “The Thing”.
Sempre em tom de investigação e curiosidade, seu personagem encara os fatos e vai atrás dos próximos. Esse monstro que possui as pessoas foge, como um humano falso em MIB. Logo, no topo da mecânica de possessão para alcançar lugares adiante que o seu atual humano não vai, você precisa perseguir o infrator assassino em série nos becos. Assim, o jogo parece introduzir leves toques de Dead By Daylight, onde é necessário perseguir sua “vítima” enquanto evita obstáculos deixados para trás e utiliza facas de arremesso para atrasar seu rival de perseguição. O jogo tenta inserir elementos de travessia utilizado em grandes títulos de mundo aberto, quando você pode dar saltos enormes entre pontos estabelecidos marcados por ícones, e é uma distração divertida, mas não uma mecânica que traz algo para o game. Também poderemos experimentar a mecânica de Siren, podendo enxergar a partir do ponto de vista do monstro disfarçado, para voltar ao jogador que deverá jogar o dito cujo contra a parede. Percebe como essa salada acontece inconsequentemente? Os segmentos das missões já são curtos, e colocar esse passo a passo que troca rapidamente para outra gameplay deixa o todo muito raso e sem sensação alguma de realização.
O confronto decisivo contra o monstro é o boss de sua breve missão. É aí que você deve aproveitar ao máximo a mecânica de possuir corpos na rua para bater no chefe. Esse é o único momento em que se sente que você finalmente está jogando algo que não está sempre te mandando para o próximo castelo.
Para não dizer que a salada para por aí, às vezes você se encontra tentando se infiltrar em prédios e lugares proibidos. Nessa parte o jogo passa a sensação de que está tentando inserir algo de Hitman em sua receita. Mas, isso apenas corrobora com o grande sentimento de que Slitterhead está em crise de identidade, buscando desculpas para existir em todos os cantos. Porém, não há espaço e profundidade suficiente para explorar cada uma de suas ideias, que ainda por cima sofrem por estarem sendo executadas dentro do mesmo framework técnico.
Logo, os encontros às vezes injustificáveis dos protagonistas, que dispensam apresentações maiores entre si, se torna quase uma narrativa de anime de sábado de manhã, sem compromisso algum com suas próprias amarras.
Contudo, e mesmo assim, podemos curtir toda a esquisitice deliberada e não deliberada do game. Estamos falando de coisas como a esquisita música de menu entre as missões, quase tão estranha quanto a música de batalha do hit Metaphor ReFantazio. Akira Yamaoka está dando as caras na trilha de Slitterhead, mas são poucos os momentos em que ele se destaca. Todavia, dá para notar um crescimento como músico e os que você ouve nesse jogo no geral ainda é mais provocante do que qualquer trilha de um jogo de 200 milhões de dólares.
SLITTERHEAD
SCORE - 6.5
6.5
Você pode jogar
Slitterhead é um jogo mediano mas não merece ser zombado, pois isso seria sinal de fraca percepção da profissão ingrata de fazer jogos eletrônico, que ainda pode ser exercida com amor, mas também sinaliza ao jornalista de que se você deseja atenção, tenha mil outras empresas que merecem cobertura negativa antes de partir para o alvo fácil. Slitterhead como um todo soa como o primeiro jogo de uma grande franquia que se acerta a partir do segundo. Não tenho certeza de que haverá uma continuação, mas fico na torcida.