
Ruffy and the Riverside remete a duas sensações vindas de uma mesma época: a dos jogos como Banjo & Kazooie e Paper Mario. Essas serão as primeiras impressões de quaisquer pessoas que pararem para analisar o título. Seu estilo de arte único guia o caminho para um jogo que acerta nas frentes mais óbvias, mas não causa uma sensação plena de realização quando estão reunidas.
Ir com expectativa para algo é sempre muito arriscado, e foi através da demo de Ruffy, que joguei muitos meses antes do lançamento final, que me convenci de que estaríamos diante de algo tradicional, com fases focadas puramente em desafios de plataforma e hordas de inimigos salpicadas pelos caminhos. O jogo final se revela, porém, com um level design complexo, e confesso que as horas iniciais me deixaram confuso quanto à sua estrutura.
Após ter um gostinho da mecânica central de nosso ursinho encapuzado, somos apresentados a um mundo semifechado composto pelo castelo do reino e suas terras para explorar. Confesso que esse mundo se mostra orgânico, com seus personagens espalhados de forma muito mais coerente do que os inimigos pontuais. Isso certifica que não teremos mundos mortos, nos quais passaríamos o jogo inteiro nos perguntando como seria se nos sentíssemos vivos dentro disso tudo. Em troca, temos uma presença esporádica de inimigos – até bem menos do que em Super Mario 64 ou em Conker’s Bad Fur Day. Cito este segundo por seu ritmo diferenciado de apresentação de obstáculos vivos, mas, no fim das contas, o que mais consigo pensar é que Ruffy and the Riverside é uma emulação ampliada dos jogos do Banjo.
Certo, mas então, o que podemos esperar de atrito no reino de Riverside? Apinhado de puzzles dinâmicos e rápidos, o jogo coloca em cada canto deste mundo algum desafio de lógica que deve ser executado pelo jogador. A maioria envolve observação e percepção do posicionamento de objetos, como padrões em paredes que devemos repetir em mecanismos próximos, por exemplo.

SWAP!
Costurando entre esses afazeres está a mecânica central mencionada anteriormente. Ruffy possui o poder de concentrar as propriedades de um objeto em uma bola de energia e lançá-la contra outro objeto-alvo, que então ganhará as mesmas propriedades do primeiro. Um exemplo prático: se eu miro em uma copa de árvore e absorvo sua propriedade, poderei mirar em uma cachoeira para transformá-la num tapete vertical de vinhas para que possamos escalar!
É aí que entra a brincadeira mais divertida do jogo: adivinhar qual será o resultado físico que uma transformação irá oferecer e quais serão as consequências — assim como blocos de Minecraft podem reagir dependendo de sua disposição no mundo ou em relação a outros blocos de diferentes propriedades. Mais um exemplo: se eu tenho três pilares altos de pedra e no quarto pilar está meu objetivo, mas não consigo escalar nenhum deles por serem muito altos, o que farei? Observo que esses pilares são compostos de pedras amontoadas em formato de roda; fica óbvio que são peças independentes. Procuro uma árvore próxima, sugo sua propriedade de madeira e transformo cuidadosamente apenas algumas rodas dos pilares em madeira, de forma que eu consiga atacá-las e quebrá-las — já que, pela lógica, madeira pode ser fragmentada com facilidade. Quebro de modo que cada pilar fique em níveis diferentes, formando uma escada para chegar ao objetivo. Se quisermos ir além, podemos incendiar a madeira, pois ela queimará e se fragmentará, sem que precisemos usar ataques diretos.
Partindo desse princípio dos elementos, incêndios podem ser apagados, NPCs indesejados expulsos de lagos, objetos transformados em pontes temporárias, etc. Baseado nas propriedades dos materiais, podemos criar pontes para nós mesmos ou para objetos rolantes, obstruir caminhos e trilhos, e assim por diante. Isso por si só torna o jogo interessante, e é nesse aspecto que Ruffy and the Riverside se apoia.

Estruturalmente jogando
É aí que topamos de novo com a estrutura do jogo, que achei demasiadamente arbitrário inicialmente. Digo “inicialmente” porque não há pistas de que o jogo se expandiria para outras direções, e depois de sair aleatoriamente por aí resolvendo enigmas — para, claro, obter os coletáveis — temos a plena impressão de que o jogo todo se comporta assim, num ciclo quase circular.
Seguir os objetivos vai lentamente contar a história, que, depois de um tempo muito maior do que eu gostaria, revela o vilão e o grande propósito do jogo. Mesmo assim, a estrutura parece confusa, sem nos dar um chão confiável, a fim de sentirmos que estamos em um fluxo contínuo, em um jogo com algum padrão no desenrolar. As coisas parecem ir se acalmando e encontrando seu lugar ao perceber que, sim, temos outros “mundos” para visitar. Porém, confesso que nunca sabia se o local em que eu estava era o último daquela etapa, achando que o jogo havia se expandido ao máximo territorialmente, pois, a essa altura, estou francamente impressionado com o escopo.

É aqui que percebo o quanto Ruffy and the Riverside deseja emular Banjo & Kazooie, inclusive com diálogos um pouco mais extensos do que eu gostaria nos NPCs. Porém, felizmente, acredito que a obra se distancie da armadilha de ser um Yooka & Laylee ao entregar mais conteúdo de gameplay e menos botões para avançar diálogos dentro de um jogo centrado em mecânicas.
Para literalmente colorir a aventura, temos a direção de arte — que, no fim das contas, é o aspecto que mais chama atenção desde o primeiro contato. Minha impressão é de que quase tudo em Ruffy and the Riverside foi pintado com canetinha hidrocor. Essa escolha genial proporciona um diferencial enorme mesmo diante de orçamentos limitados, demonstrando um nível profissional de planejamento de projeto.
Estilo pra dar e vender
Os seres vivos do jogo são silhuetas chapadas, como em Paper Mario, mas ganham vida com animações quadro a quadro que transbordam charme. Também é engraçado observar o design dos personagens por não parecerem excessivamente infantis: há, por exemplo, um pássaro de capuz que parece sempre estar envolvido em algum “shady business” — para nós, brasileiros, lembra até um maloqueiro na espreita. Situações como essa arrancam risadas internas e fazem de Ruffy uma figura adorável, ainda que malandra.
A dancinha de Ruffy, acompanhada de músicas com toques de rap dos anos 80 e 90, rasga entre as trilhas, conferindo ao projeto um tom “cool” que um Sonic dos anos 90 certamente aprovaria. Essa mistura de referências infantis e urbanas constrói uma identidade audiovisual forte, mesmo que inspirada nos títulos do Nintendo 64.

É uma pena sentir que Ruffy and the Riverside poderia incluir ainda mais fases tradicionais de plataforma pura, aquelas em que pensamos em timing e pulo durante dez minutos seguidos. Felizmente, temos outras pequenas ideias de jogos 3D que fizeram sucesso ao longo do tempo. Poderíamos até contar com trechos 2D — lembrando as memoráveis seções da Odyssey da Nintendo — para diversificar ainda mais a experiência.
Tenho certeza de que, por Ruffy and the Riverside não ser um jogo do eixo USA–JP, sentiremos um sopro de novidade entre tantos títulos atuais que pouco ousam temáticas diferentes. Espero muito que o estúdio Zockrates Laboratories, da Alemanha, prospere e nos presenteie em breve com um Ruffy 2.
Ruffy and the Riverside será lançado em 26 de junho de 2025 para PlayStation 5, PlayStation 4, Xbox One, Xbox Series X|S, Steam e Epic Games Store.
RUFFY AND THE RIVERSIDE
SCORE - 7.8
7.8
BOM!
O seu jogo de férias ensolaradas chegou! Embora sua estrutura pareça solta um pouco além da conta, o visual paga tudo enquanto fazem cócegas gostosas em seu cérebro .