Temos um produto estrangeiro na área. O que quero dizer com isso é que hoje não vamos nos basear em um jogo japonês ou um jogo americano – que normalmente são o status quo em termos de celeiros de jogos de videogame. A obra de hoje é fruto das terras espanholas, de Madrid. Estamos falando da Tequila Works, então, ao ouvir esse nome, não se engane, não estamos falando de um estúdio mexicano, não estamos falando da DrinkBox, a desenvolvedora de Guacamelee (que é canadense).

A Tequila Works produziu jogos com um sentimento super de produção indie, como Rime e, em pleno boom do Xbox Live Arcade, o Deadlight. Ambos são jogos super competentes.

A grande característica que noto nos jogos desse estúdio, tendo jogado todos os mais famosos, é que eles não se aprofundam muito nem na narrativa, nem na parte de mecânicas. Isso não significa que sejam experiências rasas, como a maioria dos jogos Walking Simulator (e não, Death Stranding não é um walking sim). Na verdade, há comprometimento suficiente em Gylt, tanto na narrativa quanto nas mecânicas, mas não a ponto de se tornarem excessivamente expressivos.

Gylt era uma das poucas cartas na manga que o estranho projeto Stadia proporcionou. Esse jogo era um exclusivo daquela plataforma, o que significa que, assim como Horizon Chase 2 (um título ainda exclusivo de uma plataforma que não me importo), só vou considerar sua existência real uma vez que eles sejam disponibilizados em um formato mais tradicional, em um formato em que eu esteja confortável, longe das modernidades que destituem várias características do que um videogame era antes (como por exemplo o fim dos manuais e agora das mídias físicas).

Se eu perguntar ao Chat GPT o que é o jogo Gylt, eis o que ele me retorna:

“Gylt é um jogo de aventura e terror desenvolvido pela Tequila Works. A história segue uma jovem chamada Sally, que está em busca de sua prima Emily em uma cidade sombria chamada Sublimis. Sally deve explorar os ambientes assustadores e solucionar quebra-cabeças para desvendar os segredos sombrios que cercam a cidade e sua família.”

Certo, a gente pode quebrar a resposta do Chat GPT em pedaços para comentar o que é informação fria e as coisas em que ele está romantizando demais nas palavras para talvez alimentar um suposto esquema de SEO.  Até aqui, eu posso concordar com o que ‘ele’ diz.

Então, ‘ele’ segue:

“A cidade de Sublimis está repleta de criaturas grotescas e sinistras, e Sally deve se esconder e evitar o perigo enquanto busca pistas sobre o paradeiro de Emily. Ao longo da jornada, ela descobre que a cidade é habitada por seres aterrorizantes conhecidos como “Gylt”, que são criaturas que representam os medos e traumas das pessoas.”

Então é aqui que o nosso robozinho tão famoso começa a se emocionar demais, mas vamos ser razoáveis e descrever isso melhor. Após o jogo se iniciar e introduzir os comandos básicos através de uma fuga na floresta ao estilo de Alan Wake (marque este fato, porque esse jogo tem totalmente a definição do jogo da Remedy), ainda estamos nos perguntando quais serão as características predominantes na parte de mecânicas, e fica muito claro inicialmente que a base seria um jogo de stealth, o que encarei com um pouco de preguiça. Logo, estamos passando por caixas e barreiras para evitar os monstros e percorrendo uma escola à la Silent Hill, mas sempre de forma muito leve. Como eu disse, o jogo não vai apresentar nenhuma característica mais forte que a outra, mas assim que enxergo certas notas de backtracking e “metroidvania” (no sentido de passar por passagens que serão desbloqueadas depois de adquirir um item mais à frente), a fração de prazer ao jogar esse jogo aumentou um pouquinho, mas sempre ainda preparado para me desapontar ao pensar em jogar suas 6 horas inteiras baseando-se apenas em furtividade.

Mas, prosseguindo com a breve descrição do Chat GPT:

“Sally deve enfrentar seus próprios medos e lidar com os horrores de Sublimis para encontrar Emily e desvendar a verdade por trás dos mistérios sombrios que cercam sua família. O jogo combina elementos de exploração, resolução de quebra-cabeças e stealth para criar uma experiência emocionante e assustadora.”

Embora o cenário faça um bom trabalho em fingir que a cidade é um grande local, a realidade é que temos uma linearidade bem disfarçada, mesmo quando entramos nas ‘dungeons’, onde pensamos que passaremos mais tempo indo e voltando pelos lugares. A cidade de Sublimis traz uma sensação nostálgica de thriller muito agradável, algo que os desenvolvedores buscaram em Stranger Things, tanto em demonstrações explícitas de inspiração quanto em coisas mais sutis. Gylt é um jogo com um design visual bastante próximo das animações da Dreamworks ou Pixar, mas peca ao evitar violência e outros elementos mais intensos. Portanto, embora seja um charme adicional e um diferencial, é difícil se sentir intimidado na maioria das vezes, exceto por alguns designs de inimigos únicos, que rapidamente trazem um pouco de medo. No entanto, o sentimento geral é que o jogo precisa fornecer outras sensações, pois a sensação de adrenalina em jogos tensos se perde rapidamente, se é que existia.

Ao longo do caminho, encontramos puzzles, sim, como relatado no texto automatizado, mas eles são tão fáceis que não têm tempo para serem considerados verdadeiros desafios. E já que o jogo quase não apresenta desafio real, pelo menos em troca, proporciona a sensação de prazer ao se desenrolar de forma fluída.

Eis que a principal mecânica de Gylt será jogar o feixe de luz na cara e em outros pontos dos inimigos, a fim de “estourar” essas feridas brilhantes. Destrua todas elas e o inimigo será derrotado e evaporará. Há um prazer em voltar aos locais para ter sua vingança e destruir os inimigos que você teve que enfrentar com mais cuidado anteriormente, mas normalmente não é necessário, pois nem todos os cenários exigem que voltemos a um local. Para corroborar com o baixo nível de dificuldade do jogo, você pode ficar atrás de barreiras, que os inimigos não conseguem ultrapassar, e assim você pode destruí-los calmamente, um por um. Esse pequeno desequilíbrio tentou ser corrigido ao dar poderes de atirar poderes malignos em direção à sua personagem, mas não é algo que ajude muito a sentir que não é um jogo em que você resolva as coisas com bastante facilidade. Para obter mais energia para a lanterna, você precisará coletar baterias para recarregar o aparelho. Vou deixar você pensando onde toda essa mecânica já foi vista antes, sem nem mudar as alegorias visuais…

Então, o que mais pode ser oferecido aqui? Se o combate está ok, como podemos contar com a narrativa?

O tema central de Gylt gira em torno do bullying e do sofrimento causado às pessoas, expressando as instabilidades emocionais que elas enfrentam. Em sua jornada, encontraremos vestígios desses atos cometidos, assim como diários com uma escrita sempre em tom triste. No entanto, não espere um grande aprofundamento textual, pois o jogo investe mais na parte visual.

Por falar nisso, o estilo de algumas cutscenes em desenhos quebram um pouco da imersão quando surgem, e elas aparecem arbitrariamente, às vezes durante momentos normais, renderizados em 3D, e outras vezes em forma de desenhos. Felizmente, gosto muito do estilo e traço dos desenhos e dos modelos em 3D, que contribuem fortemente para a identidade de Gylt.

Gylt é um conteúdo que se encontra no meio de tudo que propõe, nada se excede, e talvez isso seja uma decisão totalmente pensada pelos desenvolvedores. É melhor realizar um projeto conhecendo os seus próprios limites do que tentar ser tudo e acabar se tornando nada. No entanto, essa tática que vejo sendo utilizada, pelo menos pela terceira vez, pela Tequila Works acaba contribuindo para que o título se torne uma pérola escondida no futuro, em vez de brilhar desde o seu lançamento. Certamente você não está ouvindo falar muito sobre ele, já que a campanha de marketing, na minha opinião, foi quase inexistente. No entanto, a obra tem esforço e charme próprios, conseguindo se destacar entre tantos outros lançamentos que tentam fazer algo similar, revelando claramente que o estúdio possui um potencial ainda não totalmente explorado, seja no papel ou no brilho das telas.