Modo fácil no souls-like, esta discussão precisa acabar!

O questionamento sobre o modo fácil nos jogos do estilo souls-like é necessário? Tira a essência? Serve apenas para que os casuais possam jogar e assim fazer parte do grupo? Ou algo mais?

A indústria passa por uma espécie de estagnação, os jogos não evoluem até chegar nas expectativas criadas há anos, remakes e reboots são constantes, poucas coisas acendem aquela chama em nossos corações gamers.

Mas eu diria que isso é normal, não significa que jogar vídeo game tenha perdido sua magia, 2023 foi um ano e tanto para os jogos, com obras marcantes, dignas de todos os elogios destinados a elas. Mas não estamos aqui para falar sobre coisas novas que apareceram e nos agradaram, mas sim de um assunto que é ressuscitado nas redes sociais por pelo menos seis vezes no ano, e aparentemente ele está destinado a voltar sempre, assim como o Chosen Undead, um Hollow ou até mesmo um caçador preso em um sonho.

Modo fácil

Quando a lua vermelha está baixa, a linha entre homem e fera se esvai.

Bloodborne

A facilidade nos games

Não sei quando e em qual console cada gamer começou a jogar, eu poderia arriscar e dizer que os gamers na casa dos 30 e poucos, tiveram suas atividades iniciadas no SNES, Mega Drive, passando por PlayStation e Nintendo 64, os com 40 até 50 anos, Atari 2000 foi seu primeiro amor gamer, enquanto penso sobre esta época, lembro de poucos jogos que disponibilizavam o modo fácil, e muito mais de obras não possuíam tal escolha, além de ter uma dificuldade elevada, como Contra, Battletoads, Ninja Gaiden e Prince of Persia (1992).

Então não é de hoje que alguns jogos têm apenas um modo de dificuldade, que o jogador sequer conhecia, e poderia ser fácil ou não.

Os jogadores possuíam três opções a meu ver, desistir de jogar por não conseguir passar as fases, usar trapaças ou tentar aprender a jogar.

Claro que esta última acabava sendo a mais comum, já que nem todo mundo tinha acesso a diversos jogos, para ficar testando e o acesso aos códigos do jogo não estavam a um clique de distância como hoje.

E após horas e horas aprendendo os padrões de cada fase, decorando a posição dos inimigos, usando diversas estratégias contra bosses, até enfim passar aquela temida fase.

Modo fácil ou modo narrativa?

Na era PS1 começaram a aparecer mais jogos com opções de dificuldade, separadas em fácil, normal e difícil, alguns tinham apenas normal e difícil.

O modo fácil, como o nome diz, era uma forma do jogador encarar os desafios do game sem esforço algum ou com o mínimo possível.

Ao escolher esta opção o protagonista podia ter com uma arma mais poderosa, itens especiais, causar mais danos e sofrer menos, assim aproveitando melhor a jornada, não atoa, o modo fácil atualmente é constantemente atrelado com a narrativa, chegando a ser chamado de “modo história”, em que dificilmente o jogador verá uma tela de game over.

Então podemos encarar o modo fácil como uma forma de aproveitar o game e relaxar, sem ter que aprender infinitas sequências de botões.

Mas então por que tantos jogos não deixam o jogador escolher sua dificuldade? O que está por trás da dificuldade considerada injusta nos jogos souls-like?

A resposta pode não agradar muitos, e claro que não é uma verdade absoluta, já que este texto expressa apenas uma única opinião.

Dizer isso parece bastante chato, mas julgo necessário, levanta uma boa discussão sobre o assunto, por isso vamos tentar entender este estilo que se consolidou com a franquia Dark Souls.

Quem nunca tentou derrotar um grande dragão vermelho estando no nível baixo?

Bater, rolar, morrer e tentar!

Em 2009 chegava para o PlayStation 3, uma obra que iria revolucionar a forma de fazer games desafiadores e essa mudança seria permanente.

Surgia Demon’s Souls, jogo de RPG de ação, trazendo com ele o que chamamos hoje de souls-like, a obra se passava em um reino distante, em meio uma fantasia sombria o jogador assumia o papel de um herói e iniciava sua jornada para livrar aquele mundo de seres demoníacos.

Não demoraria para o jogador descobrir que cada canto e cada coisa que se movia naquele jogo tinha praticamente a missão de eliminar nosso personagem, até mesmo os que aparentemente eram inocentes, por vezes nos levavam para armadilhas mortais.

A obra saiu da mente de Hidetaka Miyazaki, considerados por muitos um gênio da indústria dos jogos, de forma bastante rápida o jogo ganhou força em grupos mais fechados de jogadores.

Estes se esforçaram para tentar entender como avançar em um game tão agressivo, já que a frustração em morrer com apenas um golpe era constante.

Para completar, o personagem tinha duas formas, a física e a espiritual, ambas influenciavam a Tendência de Mundo, detalhe importantíssimo para a jornada.

Modo fácil

Em 2011, Dark Souls chegava para fixar de vez o gênero souls-like, com uma evolução gigantesca, ele se apresentava como sucessor espiritual de Demon’s Souls.

Desde então, a obra serviu de inspiração para inúmeras outras, mas nenhuma delas conseguiu sequer chegar perto de Dark Souls, seja em level design, dificuldade ou até mesmo público, isso porque o jogo não só tinha um criador muito inventivo, mas possuía outra coisa única, sua comunidade.

Sim, eu sei que você já deve ter visto muitos comentários indigestos daqueles que são fãs da saga, mas deixemos o Twitter de lado, vamos focar apenas na parte boa da comunidade.

Choosen Undeads, uni-vos!

A saga souls nunca foi algo simples de vencer, a complexidade de alguns inimigos afastava e afasta até hoje muitos jogadores iniciantes, totalmente compreensível.

No começo, a forma mais fácil de aprender a jogar era lendo as dicas dos fãs, a comunidade de Dark Souls sempre foi muito prestativa.

E parte disso surgiu justamente pela dificuldade presente na obra, mas alguns se negaram a desistir, persistiram até finalmente entender que ali havia uma curva de aprendizado, e ela não poderia ser ignorada.

A base de fãs se uniu para aprender e ensinar cada passo novo que era descoberto, cada item, onde estavam, como evitar as principais armadilhas, como vencer caminhos complicados.

Tudo isso em meio as falhas, tentativas, falhas e tentativas novamente, qual arma era melhor, quais status priorizar, onde ir primeiro etc.

Claro que a genialidade dos desenvolvedores toma a maior fatia do sucesso estrondoso da franquia, mas os fãs não ficam de fora.

Majula é um local tão lindo, que nos faz esquecer que em poucos minutos iremos sofrer…

Miyazaki parecia saber disso, pois diversas mecânicas no jogo permitem interação online, a começar com as mensagens escritas no chão, que podiam conter dicas e alertas sobre os perigos da região.

Os fantasmas de jogadores em outros mundos, que mostravam seus últimos momentos antes da derrota, nos fazendo ficar espertos na área atual.

Sem contar nas invocações de outros jogadores, para nos ajudar contra o chefe de uma fase especifica, jogar assim dava uma cara nova ao jogo.

Dark Souls no fundo necessitava da união dos jogadores, indireta ou diretamente, você poderia zerar o game sozinho, e tudo bem, mas contar com a ajuda de jogadores do mundo todo, focados em desbravar os cantos escuros do jogo, fazia diferença.

Luz e trevas

Aqui, nossa discussão sobre o modo fácil retorna, a imersão e experiência do jogo seriam as mesmas se por exemplo, ao colocarmos em um modo fácil, os espíritos de New Londo Ruins sofressem dano sem a necessidade de um item especial?

Ou se a maldição causada pelo Basilisk, pudesse ser removida de maneira mais simples, ou até mesmo não afetasse o jogador em um modo mais simples de dificuldade, teríamos a mesma sensação de completude, de superação, de aprendizado?

E tudo bem se você achar que isso não precisa ter em um jogo de vídeo game, mas existe, até agora sempre que o assunto surge, percebo que todos os argumentos não levam em consideração que o jogo possui muitas formas de ser vencido, mas é preciso pelo menos querer aprender uma delas.

Miyazaki não colocou uma área que exige um nível elevado do jogador, com inimigos especiais bem no começo do game atoa.

Certamente ele queria dar um choque inicial, permitindo que o jogador entendesse que ele não deveria estar ali, não naquele momento.

Como em As Catacumbas, tomadas por uma escuridão amedrontadora e inimigos ainda piores, você pode ir até esses locais logo de cara, mas você deve?

Perceba que todas as saídas para cada um desses “problemas” estão dentro do próprio jogo, ele não lhe pede uma sequência de botões complexa.

Pede apenas que você tente uma nova rota, adquira mais conhecimento, força, e o principal, mais confiança para encarar as áreas mais cruéis.

Você parte, rumo ao confronto com outros mortos vivos, até encontrar um dragão vermelho, agora você sabe que este desafio ainda não é pra você.

E até chegar no grande Taurus Demon, você terá aprendido o suficiente sobre o game, após isso, dificilmente você quer desistir.

Conhecimento é poder

Após avançar no jogo, tendo enfrentado uma certa quantidade de chefes, sub-chefes e inimigos bizarros, é provável que, mesmo sem perceber, você tenha substituído o pensamento de “isso é impossível” para “como será que eu passo dessa fase”, pois agora você sabe que há como, você só não sabe.

É hora de voltar nas catacumbas, onde era impossível enxergar o chão que pisávamos, pois você achou um vendedor, e dele você comprou uma lanterna.

Aqui você já deve ter percebido que a história do jogo é contada em textos, neles moram as dicas mais preciosas.

Como em um certo item que permite que o jogador cause danos aos inimigos fantasmas, assim, uma nova área está ao seu alcance.

Antes que o jogador perceba, ele passou por todos aqueles desafios que uma hora julgou como injustos ou impossíveis, tudo isso sem um modo fácil.

Apenas usando recursos dentro do próprio jogo, itens, armas, dicas, ajuda de outros jogadores online, builds etc. Em alguns casos, o jogo pode finalmente ter ficado fácil.

Modo fácil

E isso ocorre em todos os outros jogos, Dark Souls 2, 3, Bloodborne, Sekiro (esse aqui exige realmente um pouco mais habilidade) e no mais recente, Elden Ring, este último é o maior exemplo de que a saga pode e vai sempre dar recursos para facilitar a vida do jogador.

Em Elden Ring é possível invocar uma cópia exata do nosso personagem, fazendo assim uma luta de dois contra um, em chefes ou inimigos normais.

Sem contar as magias, armas, builds que destroçam os mais poderosos monstros com apenas alguns golpes, é a junção perfeita da saga, um jogo completo.

Podemos dizer que certas mecânicas no jogo nos dão o modo fácil.

Modo fácil e acessibilidade.

Este é um assunto delicado para tratarmos, por dois motivos; eu não sou portador de deficiência, dificilmente irei falar com total propriedade sobre o assunto.

Outro ponto é que muitos usam este argumento para querer sair por cima de uma discussão que não tem 1% da importância necessária sobre acessibilidade.

Entretanto, games mais recentes vêm recebendo muitas opções de acessibilidade, muitos jogos da Sony possuem inúmeras funções que permitem que os jogadores aproveitem ao todo a obra.

Dizer que acessibilidade é o modo fácil, limita um assunto complexo, não adianta por modo fácil onde você simplesmente um barranco é ameaça.

Ele deveria vir junto de muitas outras opções e modificações nos jogos, para que assim a obra ficasse de fato acessível.

Modo fácil

Chegamos na parte que irrita aqueles que ainda discutem sobre isso na internet, a afirmação de que “nem todo jogo é para todo mundo”.

Essa frase parece arrogante, talvez ela seja mesmo, pois ela traz uma aparente tentativa de exclusão para uma parte dos jogadores.

Quer dizer que este jogo não é para mim? O que faz dele um jogo tão único que apenas um grupo seleto possa ter acesso?

E se eu quiser me esforçar e tentar aprender a jogar? Não posso? Por vezes eu realmente acredito que parte disso possa ser verdade.

Ano passado um dos lançamentos mais aguardados finalmente chegou, Starfield, o jogo de orçamento gigantesco da Microsoft, e sinceramente, não pude me importar menos.

E está tudo bem, uns dizem que é incrível, melhor jogo já feito, mas não me desperta o menor dos interesses, estou errado? Ou vai ver, nem todo jogo é para todo mundo.

Esta discussão precisa acabar!

Sempre existiram jogos que uns gostam, outros não, mas o assunto em questão me soa muito mais com quem não quer que exista algo passando essa sensação de ser inalcançável.

O que nem de longe os jogos da saga souls é, pelo contrário, conforme abordado neste texto de maneira bem simples até.

Basta procurar as outras explicações sobre como os jogos da From Software foram feitos com uma curva de aprendizado única, como seu level design deixa a sensação de jornada ainda mais gratificante.

Sem seus inimigos cruéis e implacáveis, ir do ponto A ao B seria uma experiência vazia, não possuiria interesse algum, seria apenas mais um.

Duvido que a saga teria influenciado uma vastidão de outros títulos, se ela possuísse uma opção de deixar tudo mais fácil.

A experiência de superar cada inimigo, descobrindo os segredos do mundo, e finalmente ver os créditos finais só é possível pois o jogo todo é um grande desafio, ele saiu da mente de seus criadores assim.

As vezes a vingança não é completada no final, o escritor não deixa tudo explicado, jogos mais preciosos são aqueles que possuem algo que os torna únicos.

Modo fácil
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